Processo
0025/2022-CRI1
Relator
Catarina Castro
Primeiro Adjunto
Amadeu Carlos
Segundo Adjunto
Tânia André
Descritores:
Recurso Ordinário, Processo Penal 1ª Espécie, Tribunal da Comarca do Lubango - Homicídio Qualificado.
PROC. N.º 0025/2022
ARGUIDOS: A,
m.i. fls. 18, 33.
B, m.i. fls.17, 26.
A
c ó r
d ã o
Em nome
do povo acordam em conferência, os Juízes Desembargadores da Segunda Secção da
Câmara Criminal deste Tribunal,
1. RELATÓRIO:
Na Segunda Secção B da Sala das
Questões Criminais do Tribunal da Comarca do Lubango, mediante Querela do
Ministério Público, foram os arguidos A,
solteiro de 22 anos de idade (à data dos factos), Pintor de profissão, nascido
aos 10 de Outubro de 1997, filho de X
e de Y, natural de Lubango,
Município de Lubango, Província da Huíla e residente no Bairro (…), m. i. fls.18,
33 e B, solteiro, de 25 anos de idade (à data dos
factos), nascido aos 10 de Março de 1994, filho de X e de Y, natural do
Lubango, Município de Lubango, Província da Huíla e residente no Bairro (…), m.
i. fls. 18 e 26, acusados e pronunciados como autores materiais do crime de Homicídio Voluntário Simples, p. e p.
pelo art.º 349º do Código Penal de 1886.
Realizado o julgamento e
respondidos os quesitos que o integram foram, por acórdão datado de 05 de Novembro
de 2020, os arguidos condenados nas seguintes penas:
1. A, (Autor):
- 22 (vinte e
dois) anos e 10 (dez) meses de prisão maior;
- kz. 60.000,00 (sessenta
mil Kwanzas) de taxa de justiça;
- kz.5.000.00
(cinco mil kzas) de emolumentos ao seu defensor oficioso.
2. B, (Cúmplice):
- 18 (dezoito)
anos e 8 (oito) meses de prisão maior;
- 50.000,00Kz
(sessenta mil Kwanzas) de taxa de justiça;
Foram ainda ambos
arguidos condenados no pagamento solidário de kz. 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos
mil Kwanzas) de indeminização por danos morais aos familiares da vítima ou a
quem se acha com direito a ela.
Desta decisão interpôs
recurso em acta de fls. 256 e 256vº, o Digno Magistrado do Ministério Público
do Tribunal “a quo”, por imperativo legal, nos termos dos artigos 473º § único
e 647º nº 2 § 1º do Código de Processo Penal, bem como, o arguido B, por intermédio do seu Mandatário Judicial, por inconformação da decisão condenatória, nos
termos dos art.º 647.º n.º2 do C. P. P.
de 1929, pois para tal tem legitimidade e está em tempo, requerendo que o mesmo
seja admitido com efeito suspensivo, devendo subir nos próprios autos, tendo
sido o mesmo sido admitido.
Decorrido o prazo
legal, o arguido B apresentou as
suas alegações em fls. 269 para fundamentar o seu pedido nos seguintes termos:
“A
audiência de discussão e julgamento é uma fase fundamental do processo penal
cujo objectivo consiste na produção de provas para obtenção de um juízo seguro
de que foi o arguido aquele que cometeu os factos que constituem o crime de que
vem acusado e pronunciado, que por eles responde nos termos da lei.
Como
é possível imputarmos ao arguido a qualidade de cúmplice deste tipo legal de
crime, se primeiro, a vitima morreu de facada e não de bofetada? Segundo, se o
arguido em momento algum soube ou sabia que o seu comparsa tinha consigo uma
faca?
Na
aplicação da pena o tribunal “a quo” não teve em atenção os critérios
estabelecidos no art.º 84.º do C. P. de 1886, quanto a gravidade do facto
criminoso e os seus resultados a intensidade do dolo ou o grau da culpa, os
motivos do crime e, principalmente, a personalidade do delinquente. Pois aqui o
tribunal ignorou o facto do arguido ser delinquente primário, de estar
arrependido, a intensão do arguido de evitar um mal ou produzir um mal menor, a
espontânea reparação do dano, a embriaguez incompleta, a sua humilde condição
económica e o seu baixo nível acadêmico social.
E
termina pedindo a reapreciação da decisão recorrida com vista a sua alteração.”
Nesta instância
ao ser lavrada a nota de revisão, apontou-se o facto do Magistrado do Ministério
Público junto do Tribunal “a quo” não ter assinado a notificação de 184vº, a
ausência das assinaturas dos Juízes Assessores nas actas de julgamento e nos
acórdãos de fls. 242v, 255, 256v.
Nesta instancia foram
mandados seguir os termos de recurso por nada obstar ao seu conhecimento.
Ao ter vista dos
autos, o Digno Magistrado do Ministério Público junto desta Câmara emitiu o seu
douto parecer, consubstanciado resumidamente no seguinte:
“Constata-se
a existência de menos circunstâncias agravantes em relação às atenuantes,
assim, seria bom reduzir-se a pena aplicada ao autor, todavia, deve se manter dentro
da moldura penal abstracta do referido artigo 351º do C. P. e, alterar-se a
pena aplicada ao cúmplice com base no art.º 2 n.º 2 do novo Código Penal, por
ser o mais favorável.”(fls. 286)
No cumprimento do art.º 483.º n.º 1, em função do exame preliminar
foi, pela Relatora ordenado o cumprimento do disposto no art.º 148.º do C.
Cust. Jud. e a recolha das assinaturas dos Juízes Assessores nomeados ad hoc
nas acta e acórdãos de fls. 235 a 242v do tribunal a quo. No decurso do prazo
legal tais diligencias foram cumpridas. (fls. 301 e 305)
Cumprida as diligencias acima mencionada e, em conformidade com o
disposto no art.º 479.º n.º 1 do C. P. P., este Tribunal “ad quem” admitiu o
recurso, por ser legal, legítimo e tempestivo, podendo ser tramitado, em
algumas fases, como de agravo em material cível.
*
Questão Prévia:
O Código de Processo Penal Angolano,
aprovado pela Lei n.º 39/20 de 11 de Novembro, não prevê a interposição de
recurso por imperativo legal, porém
à data em que este recurso foi interposto
ainda vigorava o Código de Processo Penal de 1929, que de entre as suas normas,
integra a que impõe ao Ministério
Publico a interposição de recurso por
imperativo legal. O que ocorreu no caso em apreço, atendo-se ao
cumprimento da lei, tendo em conta o papel preponderante
do Ministério Público na busca da justiça das decisões, segundo critérios de
objectividade e não de parte, podendo, se for necessário, impor uma actuação em
favor dos arguidos, para garantir o acesso ao direito e a tutela
jurisdicional efectiva, independentemente da apresentação das alegações motivadas.
(art.º 473.º § único do
C.P.P. de 1929)
Outrossim,
tendo em conta a função didáctica que este Tribunal da Relação deve
necessariamente assumir, antes de nos
pronunciarmos sobre o objeto do recurso propiamente dito, incumbe-nos
tecer algumas considerações quanto a tramitação do processo na primeira
instancia e os formalismos essenciais para a realização do julgamento em
tribunal colectivo, bem como também, quanto aos requisitos da sentença no
cumprimento do disposto no art.º 450.º do C. P. P. de 1929.
Ao acórdão proferido
pelo Tribunal da primeira instância temos a abordar que, a estrutura externa utilizada na
elaboração da sentença obedece, minimamente, o estabelecido na lei, por se
apresentar, um tanto quanto conforme ao que aquele preceito legal solicita,
designadamente, a identificação completa dos recorridos, a indicação dos factos
de que os recorridos vêm acusados, a indicação dos factos que se julgaram
provados, a indicação da lei penal aplicável, a condenação da pena aplicada, o
imposto de justiça e a data. (417.º do C.P.P.)
No entanto,
no acórdão omitiu o
destino legal a dar ao objecto do crime apreendido nos autos, bem como, o nome da
vítima a quem os arguidos foram condenados a pagar uma indemnização. (fls. 31 e 46, 38 e 47, 164 e 169)
A fundamentação das decisões judiciais é, num Estado
Democrático e de Direito, uma verdadeira fonte de legitimação: “a
decisão é legítima só e na medida em que está racionalmente fundamentada. E,
porque não estamos perante um poder arbitrário ou baseado numa lógica de
autoridade indiscutível que se impõe a fundamentação. O titular do poder não
dispõe deste a seu bel-prazer e presta contas do exercício deste perante os
destinatários do mesmo através da fundamentação.
A fundamentação desempenha várias
funções. Primeiro: é a de tentar
convencer os destinatários da sentença e a comunidade em geral da correcção e
justiça da decisão. Pode tal objectivo não ser atingido, mas há que tentar
sempre o atingir, porque só assim se cimenta a verdadeira autoridade, que se
distingue do autoritarismo e da arbitrariedade.
Segundo: é
a de permitir ao tribunal superior e aos sujeitos processuais o exame do
processo lógico e racional que lhe subjaz, o caminho mentalmente percorrido até
se chegar à decisão, possibilitando, assim, a interposição e o conhecimento dos
recursos. Viola claramente os princípios estruturantes de um Estado Democrático
e de Direito a prática de restringir ao mínimo a extensão e alcance da
fundamentação para «não abrir as portas ao recurso».
Por último, em Terceiro: é que a
fundamentação favorece o autocontrolo e a ponderação da parte do próprio órgão
que decide. Quem tem de fundamentar o que decide, com menos probabilidade
decidirá precipitadamente e não pensará duas vezes antes de decidir. (Drs.
António Latas, Jorge Duarte e Pedro Patto, Direito Penal e Processo Penal -
Tomo I, pag. 308, Manual de Apoio ao Curso M3, CEJ)
Como é sabido, os fundamentos dos
recursos devem ser claros e concretos, pois aos Tribunais Superiores não
incumbem averiguar a intenção dos recorrentes, mas sim apreciar todas as
questões submetidas ao seu exame.
*
2. OBJECTO DO RECURSO:
O âmbito do recurso é aferido e
delimitado pelas conclusões formuladas na respectiva motivação, sem prejuízo da
matéria de conhecimento oficioso deste Tribunal com instância superior. Pois, diferentemente
dos processos cíveis, em que domina o princípio do dispositivo das partes e os
tribunais só podem conhecer das questões que lhes são submetidas, nos processos
penais, vigora o princípio do conhecimento amplo do recurso, partindo da ideia
de que o seu objecto legal é a decisão recorrida e não a questão por ela
julgada, ainda que o recorrido restrinja o objeto do recurso, devido à
finalidade de interesse público que ela visa alcançar. (art.º 464.º
n.º 1 do CPP e Manuel Simas Santos, Recursos Penais em Angola, pag.77)
Assim, embora o recurso tenha sido interposto
apenas pelo arguido B, por intermédio do seu Mandatário Judicial, da
decisão condenatória, nos termos do art.º 473.º n.º 3 do C. P. P., este
Tribunal o conhecerá, também, em relação ao arguido A, pois
nos cabe reapreciar o processo do recurso na generalidade, isto é, tanto da
matéria de facto como da matéria de direito. (art.º 663º do C.P.P. de 1929, artº 464º n.º 1 do C. P. P. e
Ac. Relação do Porto, 06-12-1930, Gaz. Rel. Lx.ª 44.º-248).
Analisada minuciosa à decisão recorrida e as
conclusões apresentadas no parecer do Digno Magistrado do Ministério Público
junto deste Tribunal, há necessidade de se apreciar e decidir, preliminarmente,
as questões de conhecimento oficioso, antes da questão do conhecimento do
mérito da causa, que resultam das conclusões nos seguintes termos:
1.
Irregularidade na tramitação do processo
julgado por Tribunal Colectivo,
nos termos dos art.ºs 462.º do CPP de 1929, 45.º n.º3 e seguintes da Lei n.º
2/15, de 2 de Fevereiro;
2.
Verificar
se o arguido B é realmente cúmplice do
crime de que vem acusado;
3.
Reapreciar o acórdão
recorrido com vista a sua alteração.
*
3. FUNDAMENTAÇÃO:
·
Questões de conhecimento
oficioso:
Aqui chegados, cumpre-nos, primeiramente,
apreciar e decidir das nulidades ou excepções de conhecimento oficioso:
3.1. Irregularidade na tramitação do processo para julgamento em
Tribunal Colectivo.
O
Tribunal Colectivo funciona com 3 Juízes, isto é, por um Juiz de Direito,
titular do processo, que a ele preside e, por dois Juízes de Direito da mesma
Comarca que o assessoram. Em regra, este Tribunal julga os casos mais graves e
importantes, sendo em matéria penal, para o nosso caso, apreciar e julgar os
processos cujo crime seja punível, em abstrato, com pena de prisão superior a 15
anos. (nºs 2 e 3 do art.º 53º da Lei nº 29/2015 de 29 de Agosto)
O art.º
362.º n.º9 do C.P.P. , estabelece que, preparado o processo para julgamento, o
juiz o mandará com vista por um periodo variável de três a oito dias a cada um
dos dois juízes que com ele fazem parte do tribunal, conforme a complexidade do
processo. E, o dia designado para o julgamento será comunicado aos juízes que
fazem parte do Tribunal. (nº 1 do art.º 3º da Lei nº 20/88 de 31 de Dezembro e
art. 362º nº 9.º do C.P.P.)
Ora, tratando-se os presentes autos de um processo
em que os arguidos Francisco e B vêm
acusados, pronunciados e condenados por um crime de Homicídio Voluntário
Simples do tipo p. p. pelo art. 349.º do C. P. de 1886, cuja moldura penal
abtracta corresponde a prisão maior de Dezasseis a vinte (16 a 20) anos, isto é, superior a 15 anos, o mesmo deveria ter a tramitação
processual para ser julgado em Tribunal Colectivo, cujo regime processual
caberia à empregue nos processos de querela. (art.ºs 462º do
C.P.P. de 1929 e 53º nºs 2 e 3 da Lei nº 29/22 de 29/8).
Desafortunadamente, constata-se nos autos que depois
de fls. 182 a 213, isto é, desde as folhas onde consta o despacho que designa
data para julgamento até as folhas onde consta a acta da audiencia de
julgamento, não se vislumbra na tramitação processual o cumprimento do disposto
nos artigos acima mencionados, isto é, a falta do despacho de nomeação ou indicação
dos juizes assessores e a falta dos termos de vista para cada Juízes Assessores
por 3-8 dias, tão pouco, a comunicação aos mesmos da realização da audiencia de
julgamento. Assim diríamos que terá sido cometida uma mera irregularidade
processual, consistente em mandar cumprir um preceito de natureza genérico e
não o especificamente aplicável ao processo de querela.
Não sendo tal irregularidade subsumível a
nenhum dos números do art.º 140.º do C.P.P., teremos que a integrar no âmbito
do art.º 144.º desse Código.
Desta sorte, perante tal irregularidade, as
partes deveriam ter reclamado dentro do prazo legal e, sendo que não o fizeram,
caberia ao Juiz, caso ela viesse a ser arguida posteriormente, ver se tal
nulidade teria ou não influído no exame e decisão da causa, para a mandar
suprir.
Assim, analisada esta questão, diríamos em
conclusão que se trata de uma mera irregularidade que não foi arguida dentro do
prazo legal e que não afecta a justa decisão da causa, podendo ela ser julgada
suprida, desde já.
*
Suprida que está a irregularidade de
conhecimento oficioso, passamos, agora, a apreciar e decidir às questões do
mérito da causa decorrentes das conclusões.
E, por nos parecer relevante para decisão
iremos transcrever o acórdão recorrido quanto aos factos, ao enquadramento
legal e a medida da pena.
Dos Factos Provados:
Em audiência de
discussão e julgamento da causa ficou provado que, por volta das 13:00 do dia 01 de
Setembro de 2019, o co-arguido/réu A
circulava pelo bairro onde a dada altura
Postos no local
encontraram o infeliz D a quem o co-arguido/réu A solicitou os bons ofícios de
vender-lhe um telefone de marca ICON;
Aceite o pedido, o infeliz D recebeu o referido aparelho e levou-o
a procura de eventual cliente, mas volvida uma hora não regressava, facto que
preocupou o co-arguido/réu A;
Então, foi que o
co-arguido/réu A mobilizou o seu
comparsa e amigo, co-arguido/réu B,
t.c.p. "B", a irem ao encalço do infeliz D pelo bairro e depois de muitas voltas, encontraram-no numa casa
de venda de bebidas alcoólicas;
Nisso, os co-arguido questionaram
o infeliz D acerca do aparelho, ao
que o infeliz respondeu não ter encontrado cliente algum;
Desesperados com o facto, os
co-arguidos/réus A e B exigiram do
infeliz D uma compensação pelo
esforço que tiveram em procurá-lo pelo bairro, sugerindo que lhes
Enquanto, lhe faziam tal
exigência agrediam-no sendo que o co-arguido/réu B batia-lhe com as mãos e o
co-arguido/réu A batia com uma
garrafa de whisky e ele defendia-se como podia ao ponto das agressões
aumentarem de intensidade e
Como se não bastasse, o co-arguido/réu
A, empunhando uma faca desferiu um
golpe na região torácica
O infeliz D ainda manteve-se uns instantes de pé,
vindo a ser
Dos
factos não provados
Ao
longo da discussão e produção de provas, não ficou provado que o infeliz D tivesse
Não
ficou
Do
enquadramento legal:
O
co-arguido/réu A, vem
Da
Medida da pena:
Atendendo
ao grau de ilicitude acentuado tendo em atenção a natureza do bem em causa (a
vida humana) e, olhando para a descrição dos factos ocorridos desde a tortura
que a vítima D foi alvo antes da
fatalidade até a sua consumação, não repugna aos mesmos incautos o recurso ao
art.o 447.º do C.P.P. de 1929, convolando o crime de Homicídio
Voluntário Simples para o de Homicídio Qualificado, cuja moldura penal
abstracta corresponde a prisão maior de vinte à vinte e quatro (20-24) anos,
por, no entender o Tribunal, ser a pena mais adequada ao crime cometido
Aplicando-se,
por conseguinte, a pena de vinte e dois (22) anos e dez (10) meses de prisão
maior ao co-arguido/réu A e a de dezoito (18)
anos e oito (8) meses de prisão maior para o co-arguido/réu B, na qualidade de cúmplice.
*
Agora
passamos a apreciar e decidir às questões do mérito da causa decorrentes das
conclusões.
3.2. O co-arguido B é
cúmplice do crime de que vem acusado o arguido A?
Em
suas alegações o recorrente/arguido B
menciona que “Como é possível imputarmos ao arguido B a qualidade de cúmplice deste tipo legal de crime, se primeiro, a
vitima morreu de facada e não de bofetada?
Ora
vejamos, o que é ser um cúmplice?
Segundo a
doutrina do direito penal, são cúmplices de um crime todos aqueles que auxiliam
outrem a cometê-lo, embora sem esse auxilio o crime fosse praticado, mas por
modo, em tempo, lugar ou circunstâncias diversas. (art.22.º do C. P.
anotado de 1886, Maia Gonçalves, pag.42)
Segundo o dicionário Porto Editora, IFOPÉDIA, cúmplice
se define como sendo aquele que teve parte
com outrem num delito ou crime também chamado conivente; ou aquele
que facilita, ajuda ou colabora a realização de algo ilícito o ilícito; ou
ainda aquela pessoa que auxilia ou facilita a realização de um crime,
podendo não tomar parte ativa na sua execução. Esta figura se encontrada consagrada no art.º 25.º do C. P. sob a epigrafe Cumplicidade. O seu n.º 1 dispõe: “É punível
como cúmplice quem,
fora dos casos previstos no artigo anterior, prestar, directa e dolosamente,
auxílio material ou moral à prática por outrem de um facto doloso. (art.º 22.º
do C. P. de 1886)
Analisado os
factos reportados nos autos, está claramente assente que no dia 01 de Setembro
do ano de 2019, por volta das 12h00, sensivelmente, no bairro Lalula, nesta
cidade do Lubango, mais concretamente por detrás da escola dos sargentos, os
arguidos Francisco e B agrediram
fisicamente a vítima D, deferindo
contra a mesma violentos e intensos golpes de socos, bofetadas e arremesso de
uma garrafa de Whisky na região das costas, paus e pedras na região da cabeça
dela. Acto contínuo, os arguidos Francisco e B despiram a vítima D e
começaram a puxar violentamente os seus órgãos genitais, ameaçando-a de os amputar.
A dada altura das agressões, enquanto o arguido B golpeava a vítima com socos, bofetadas e arremesso de paus e
pedras, o arguido Francisco, A,
empunhou a faca que tinha consigo nas algibeiras e, com esta arma branca,
vibrou um intenso e violento golpe contra a região do peito da vitima D, causando a sua morte em poucos minutos
naquele mesmo local. (fls. 71v, 72,
115,)
Desde o momento que os arguidos A e B, encontraram a vítima D
próximo à casa, onde decorria a cerimónia do Tira Luto e exigiram dela que os
compensasse com a entrega do seu bluetooh pela maçada que tiveram à procura-la
pelo bairro, ambos arguidos agrediram fisicamente a vítima D ao longo de todo percurso até chegarem por detrás da escola dos
Sargentos, onde a mesma foi golpeada com a faca pelo arguido A pondo fim a sua vida. (fls. 66, 6780, 81, 82, 83, 138 a 155, 159)
Como reportam os autos, este
tribunal constacta que não há qualquer sombra para duvidar de que o arguido B é realmente cúmplice do crime em que
vem acusado e condenado o arguido A.
Tudo porque se verifica que desde o primeiro momento em que começaram a agredir
a vítima D, ele auxiliou material e moralmente à prática do seu
comparsa A, no facto doloso. Ao que,
a sua alegação de que não é cúmplice nos presentes nos autos, não procede.
Quanto
a segunda alegação de que “O arguido B em momento algum soube ou sabia que o
seu comparsa tinha consigo uma faca.”
Pode se aferir em fls. 74v, 81, 82, 114 e outras, que
os arguidos Francisco e B, na busca
pela vitima D no bairro Lalula,
começaram a confusão em casa do declarante Constantino, com o seu irmão
declarante Farai. E, nessa primeira confusão o arguido Francisco, t.c.p. A na presenta do seu comparsa, arguido B, t.c.p. B, retirou a faca que tinha
nas suas algibeiras e tentou desferiu um golpe contra o declarante Farai, mas
graças a intervenção da declarante Maria da Conceição e dalguns vizinhos, não
identificado nos autos, é que a actuação do comparsa do arguido B não se concretizou. Com este facto,
fica claramente provado que antes do comparsa do arguido B golpear mortalmente a vítima D
com a faca, ele tinha conhecimento sim, que aquele levava consigo uma arma
branca, faca. (fls.74v)
E, para agravar a situação, há nos
autos evidencias factuais de que, logo após que o arguido A desferiu o golpe mortal com a faca contra a vitima D, o arguido B, t.c.p. B, afirmou em alto e bom som que o seu comparsa sabe
esfaquear e que por isto a vitima não iria morrer. Dito isto, o co-arguido B pôs-se em fuga daquele local, a
semelhança do seu comparsa. Agora nos perguntamos: Como o arguido B faz esta afirmação se não sabe que o
seu comparsa anda com uma faca? (fls. 74v, 81 e 82)
Em função do aqui agora exposto e as evidencias
factuais espelhadas ao longo dos autos, duvidas não restam a esta instância de
que o arguido B sabia sim, que o seu
comparsa arguido A levava consigo
uma arma branca, faca. Assim, também nisto, as alegações do recorrente/arguido,
quanto a este facto, não procedem.
3. 2. Reapreciação da decisão recorrida quanto a sua alteração.
Os arguidos A, e B,
foram julgados e condenados, por convolação do art.º
447.º do C. P. P. de 1929, pela prática do crime de Homicídio Qualificado do tipo p. e p. pelos art.º 351.º do C. P. de
1886, com fundamento aos actos de tortura a que a vitima fora submetido, na
pena de 22 anos e 10 meses de prisão para o arguido Francisco e 18 anos e 8
meses para o arguido B. (fls.254, 255)
Assim, o crime aqui mencionado vem agravado
modificativamente, pela circunstância n.º 2.ª do art.º 351.º do C. P. de 1886, que
prevê “torturas ou actos de crueldade para aumentar o sofrimento da vítima”.
Terá, esta circunstância suporte fáctico nos autos? Vejamos.
Verifica-se que tanto na acusação, como na pronúncia vem
referido que os arguidos sãos autores materiais de um crime de Homicídio
Voluntário Simples do tipo p. e p. pelo art.º 349.º , agravado pelas
circunstâncias n.ºs 5.ª (…ameaças…), 10.ª (…cometido por duas pessoas…), 11.ª (… surpresa, traição…), 18.ª (…estrada e
lugar ermo…) e 28.ª (…superioridade em razão da arma branca, faca…) todas do
art.º34.º do C. P. de 1886.
No entanto, aquando do julgamento, o tribunal “a quo” entendeu
que o facto dos co-arguidos terem despido completamente a vitima D e, ao longo do percurso, desferirem brutais
e intensos golpes de chapadas, socos e arremesso de garrafa, paus e pedras
contra a vitima, mormente, puxando violentamente, por diversas vezes, os órgãos
genitais da vitima, isto é, testículos e pénis, eles empregaram actos de
crueldade e tortura contra a mesma. (fls.
240, 241)
Com
base na experiencia comum, constata-se que os testículos são as gônadas masculinas, responsável e responsável pela produção de hormônios
sexuais masculinos (andrógenos) e espermatozoides. Eles são considerados uma das áreas mais delicadas do corpo do
homem, sendo extremamente sensível não apenas ao toque, mas
também à pressão, como consequência de não ser protegido por músculos ou ossos. Um golpe no
testículo pode, na verdade, ser mais sério do que muita gente pensa, porque
pode causar uma torção testicular, que consiste na torção do cordão espermático, que pode ser muito grave,
pois pode causar falta de oxigenação nas células do testículo, fazendo com que
o sujeito perca os sentidos ou ate mesmo a vida, dependendo da violência da
agressão. (Naturovia,
pag. 36)
No caso “sub judice” nos parece existirem, como aliás se
provou em audiência de julgamento de fls. 240, 241 consta que desde a instrução
dos presentes autos e da acta da audiência de julgamento, os arguidos, de forma
proporcional, maltrataram e agrediram fisicamente a vitima D, desferindo conta a mesma brutais e intensos golpes de chapadas,
socos e pontapés, arremessando contra a mesma, garrafa, pau e pedra do tipo
blocos de adobo, atingindo-o em diferentes partes do corpo, com maior
incidência na região da cabeça, costas e peito. Nisso, a vitima tentou se
defender da melhor maneira que pode, mas sem sucesso. Pois, no ultimo instante,
depois de cruelmente torturado com violentos puxões e golpes de pontapés na
região dos testículos e pénis, o comparsa do co-arguido B, o arguido A empunhou
a faca que tinha nas suas algibeiras e vibrou o incisivo golpe na região da
clavícula esquerda da vitima D,
causando a sua morte, minutos depois naquele mesmo local.
Ora, é verdade que o incisivo e brutal golpe de faca deferido
na região da clavícula esquerda da vítima, tirando-a a vida, por si só, não se
consubstancia no conceito de tortura, porque não vemos nesse acto nenhuma
perversidade revelada pelo agente, constituindo este, somente, o meio idôneo para
matar. E, neste caso, para pôr fim a vida da vítima, seu fim pretendido e nada mais.
A violência e a brutalidade do golpe na consumação do crime, indiciam tão só a
intensidade do elemento subjectivo da infracção: o dolo intenso e directo com
que o réu agiu.
O Dicionário Pratico Ilustrado dá-nos o seguinte conceito: “Tortura: suplicio que se faz sofrer a
alguém.” Quer isto
dizer que, alguém antes de sofrer qualquer outro mal, por ventura, pior ou mais
grave, é submetido a tortura, suplicio ou tormentos.
Oiçamos o que nos diz Pacheco, a propósito da circunstância
n.º 5 do artigo 10.º do Código espanhol, correspondente a circunstância 23.ª do
art.º 34.º do nosso Código, citado pelo Prof. Eduardo Correia. “Propõe-se um matar outro, e ao invés de
dar-lhe desde logo uma punhalada que o acabe, começa por mutilá-lo, por
atormentá-lo, por fazer-lhe sentir a vinda da morte. Propõe se um roubar outro e,
depois de o surpreender em sua casa, amarra-lhe os braços, põe-lhe uma mordaça,
bate-lhe no fim, o que é um puro lucho de males, na ocasião em que se
encontram. Aquele homicídio, este roubo, levam consigo circunstâncias
agravantes, segundo esse número da lei. A razão de tal preceito é notória e
incontestável.
Encontramos
no caso que se nos ocupa, perversidade no caso dos arguidos, danos causados aos
familiares da vitima e um alarme para a sociedade inteira, se não tivesse
realizado este delito contra sua companheira. Todos os motivos, pois, por onde
pode agravar-se a responsabilidade, todos concorrem para este facto. A
agravação está justificada...” (Direito
Criminal, II, pag. 359.)
Outrossim, podemos agora afirmar que tanto o acto de tortura
e a perversidade existiram no caso em apreço, têm suporte fáctico na pronúncia,
pois não basta exarar nesta peça os preceitos incriminadores, é necessário que
os preceitos se apoiem em factos concretos. (Por
todos os acórdãos proferidos nos processos 23.401 e 23.373 ambos de julho de
1989 e 23.443 de 20 de 10 de 1989 do “então” Tribunal da Relação de Luanda)
Estamos, pois, de perfeito acordo com a douta decisão do
Tribunal “a quo”, no sentido de convolar o crime de Homicídio Voluntário
Simples, pelo Crime de Homicídio Qualificado do tipo p. e p. pelo art.º 351.º n.º2
do C. P. de 1886, por considerar que o diagnóstico jurídico-penal operado pelo acórdão
recorrido ser o mais ajustado a actuação dos arguidos. Pois se verifica nos
autos que estes agentes do crime empregaram actos de tortura e crueldade contra
a vitima D, puxando e golpeando os
testículos dela antes de tirarem a sua vida.
Assim, esta instância entende julgar procedente a decisão
recorrida e com fundamento nos factos alegados pelas partes e dos que
resultaram provados da discussão da causa, convolar o crime de que os arguidos
vêm acusados e pronunciados para o crime de Homicídio Qualificado do tipo p. e
p. pelo art.º 351.º n.º 2 do C. P. de 1886.
Outrossim, nada consta dos autos de que o instrumento usado
pelo arguido Francisco foi apreendido. No entanto em função dos depoimentos das
testemunhas, declarantes e dos próprios arguidos, verifica-se que se trata de
uma faca de cozinha cujo cumprimento se desconhece, mas pelas declarações acima
elencadas e a foto tabua de fls. 63 e 64, revela tratar-se de um instrumento
corto-perfurante, faca, suficientemente idóneo para tirar a vida de um ser
vivo.
O cadáver da vitima D
foi submetido ao exame de autopsia e, em conclusão verifica-se que a morte de
vitima foi devido ao choque hipovolémico, em consequência de um traumatismo
torácico, produzido por mecanismo de acção de natureza corto-perfurante. (fls. 51)
3.3. Enquadramento
jurídico penal
Ao acima exposto, duvidas não subsistem de que os arguidos A, e B, cometeram em autoria material, para o arguido Francisco, um
crime de Homicídio Qualificado do tipo, p. e p. pelo artigo 351.º n.º 2 do C.
P. de 1886 e o arguido B como seu
cúmplice, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 22.º, 351.º, 103.º e
104.º todos do C. P. aqui mencionado.
3.3.1. Aplicação da lei no tempo
Uma vez que, os factos
reportados nos presentes autos, ocorreram na vigência do C. P. de 1886, nos
termos do art.º 2 n.º 1 “ab initio” do actual C. P., lemos “sempre que as disposições penais
vigentes no momento da pratica do facto forem diferentes das estabelecidas em
leis posteriores, 16 aplica-se o regime que concretamente se mostrar mais favorável
ao agente”, há a necessidade de se
verificar qual o regime concretamente mais favorável aos arguidos.
a) Quanto a Medida da pena.
No antigo diploma, a medida
penal abstracta para o crime de Homicídio Qualificado corresponde a prisão
maior de 20 (vinte) a 24 (vinte e quatro) anos, conforme determina o art.º 351.º
n.º 1. No actual código penal, o art.º 148.º n.º 1º al. c) e n.º 2 al. a), pune
o crime de Homicídio Qualificado em razão dos meios com uma prisão de 20 a 25
anos.
Na determinação da medida
da pena tem de se ter em consideração o estatuído no art.º 84.º do anterior
código e os art.ºs 70.º e 71.º do actual C. P..
Na linha de orientação
formulado no corpo do art.º 84.º do C. Penal e também do actual art.º 71.º há
que ter em consideração para aplicação da pena os seguintes elementos
subjectivos: a personalidade do agente, ao grau de culpa, ilicitude,
intensidade do dolo, exigências de prevenção geral e especial, bem como, as
circunstâncias agravantes e atenuantes exteriores ao tipo, já acima devidamente
expostas.
A personalidade dos agentes. Tendo em consideração a gravidade do
crime praticado pelos arguidos A e B, por si só, denotam serem duas pessoas
com caracter de personalidade malformada e contrário aos valores morais e
sociais, pois não pensaram duas vezes, quando, em plena luz do dia torturaram a
vitima D, despindo-o e, de forma
violenta golpearem ao seu belo prazer os seus testículos, da maneira que
queriam e bem entenderam, tudo com ímpeto de aumentarem a sua dor de forma
cruel, facto este que aumenta, grandemente a censurabilidade das suas condutas.
O grau de ilicitude é elevadíssimo,
considerando o bem jurídico protegido – o direito a vida, constitui o bem mais
valiosos dos direitos fundamentais de qualquer ser vivo. Nesse mesmo sentido, o Prof. Catedrático ANDRÉ RAMOS
TAVARES, define este direito como sendo “o mais básico de todos os direitos, no sentido de que surge
como verdadeiro pré-requisito da existência dos demais direitos consagrados
constitucionalmente. É, por isto, o direito humano mais sagrado”.
A nossa constituição
consagra este direito no seu art.º 30º estabelecendo que “o Estado respeita e protege a vida da
pessoa humana, que é inviolável.” A violação
dolosa desse direito tem sido severamente punida pelos Estados Democráticos e
de Direito com penas de prisão nunca inferior a 14 anos. O homicídio qualificado é um crime
hediondo, porque ocorre por motivo fútil, com emprego de tortura ou veneno, ou,
ainda, dificultando ou tornando impossível a defesa da vítima, por exemplo.
Nesses casos, portanto, o crime se torna ainda mais grave do que já é. O agente
busca garantir a execução da vítima, utilizando-se de meios mais reprováveis
pela sociedade. E no caso sub judice uma arma branca, faca.
O grau de culpa é intenso, para ambos arguidos embora tenham agido
com dolo directo, pois os arguidos Francisco e Tomas desde o primeiro momento
em que foi descoberto deram voltas ao assunto, atirando-se a culpa um contra o
outro. E até o momento da audiência de julgamento, ambos não manifestaram
qualquer tipo de arrependimento, nem tão pouco os seus familiares ajudaram os
familiares da vítima D com os gastos
das despesas do óbito.
Assim, o dolo embora o consideremos dolo por ímpeto, isto é, descontrolado
em que a emoção ultrapassou a representação do crime e o seu resultado, é
directo e intenso. Tendo em conta o instrumento (faca) usado pelo arguido
Francisco t.c.p. Faquina e a zona (região da clavicula esquerda) atingia,
denota-se claramente que o arguido e companhia tinha, a intensão de tirar a
vida da vitima dos autos. Ainda que de forma repentina, como se deu. Pois
estabelece-se o nexo de causalidade entre a conduta do agente e o seu resultado.
A prevenção especial destaca essa severidade. Tal severidade é
reclamada, por se tratar de um crime que viola direitos fundamentais, gerador
de enorme alarme social e intranquilidade pública. Por isto, é necessário que
se tenha em consideração que a conduta dos arguidos provocou, necessariamente,
um trauma permanente aos familiares da vitima, que se veem privados da
companhia do seu ente querido, por lhe ter sido brutalmente tirada a vida, num
abrir e fechar de olhos. Logo, aos olhos do homem comum, mostra-se evidente que
a conduta dos arguidos é passível de qualquer censura e condenação. Pois,
constitui expectativa legítima do cidadão, que os Tribunais garantam a integral
respeito pelos direitos fundamentais e devolvam à sociedade a merecida paz
social.
São intensas as necessidades
de prevenção geral, pois o crime é
gerador de grande alarme social e repúdio geral, face à enorme intranquilidade
que gera no tecido social, sendo elevadas as exigências de reafirmação da norma
violada. Noutra perspectiva, o homicídio qualificado integra o conceito de
“criminalidade especialmente violenta”, na definição do homicídio em si, pois
foi cometido mediante recurso a uma faca, sem qualquer hipótese de defesa para
a vitima, pelo que se impõe uma pena com efeito dissuasor.
Tendo em conta aos
elementos acima citados, julgamos adequada uma pena situada entre a média e a
máxima abstractamente aplicável, isto é, a pena de prisão, para se achar a pena
concreta aplicável mais favorável com base nos dois diplomas legais.
Melhor dizendo, nos termos
do diploma anterior fixaremos as penas parcelares da moldura penal abstracta de
20 a 24 anos de prisão para o crime de Homicídio Qualificado, estabelecendo-se
como pena concreta a de 20 anos de prisão maior, para o seu autor, isto é, o
arguido Francisco. Para o cúmplice, isto é, o arguido B, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 22.º, 103.º,
351.º, 104.º todos do C.P. de 1886, cuja moldura penal abstracta corresponde a
prisão maior de 16 a 20 anos, estabelece-se como pena concreta a prisão maior de
16 anos.
No entanto, com base a lei
nova, fixaremos as penas parcelares da moldura penal abstracta do crime de
Homicídio Qualificado, isto é, a prisão de 20 a 25 anos e estabelece-se como
pena concreta a de 20 anos, para o seu autor, isto é, o arguido AFrancisco. E para o seu cúmplice, isto
é, o arguido B, nos termos das
disposições conjugadas dos art.ºs 25.º n.º 2, 148.º n.º1 al. d) e o 74.º n.º1,
al. a) e b), cuja moldura penal abstracta corresponde a prisão de 4 anos a 8
anos e 3 meses, nisso estabelece-se como pena concreta a prisão de 7 anos.
Ou seja, em ambos os
diplomas a pena de prisão maior de 23 anos para o autor e de 16 anos para o seu
cúmplice, face ao antigo código e, a pena de prisão de 20 anos para o autor e 7
anos para o seu cúmplice, perante ao actual código penal, conclui-se pela a
aplicação do regime penal actual, por se mostrar mais favorável aos arguidos.
No entanto, o Digno
Magistrado do Ministério Publico em seu douto parecer de fls. 286, conclui
alegando que “constata-se dos autos menos agravantes do que atenuantes…”. Mas
compulsado os autos verifica-se manifestamente o contrario, há mais
circunstâncias agravantes que pesam sobre a responsabilidade criminal dos
arguidos do que atenuantes. Assim que, se assim procedermos agora, a situação
penal dos arguidos seria ilegalmente agravada, pois se violaria o principio da
“reformatio in pejus”, visto ter sido o arguido B o requerente do presente recurso.
Concluindo, esta instância
entende julgar procedente o recurso interposto pelo arguido B, alterando a decisão recorrida e,
condenar o arguido A, na pena de 23
(vinte e três) anos de prisão, como autor material do crime de H. Qualificado e
o arguido B na pena de 7 (sete) anos
de prisão, na qualidade de cúmplice, no demais se confirma.
4.
D A D E C I S Ã O:
Nestes termos e pelos
fundamentos aqui expostos, os desta Câmara Criminal do Tribunal da Relação do
Lubango, acordam em conferencia, julgar
procedente o recurso interposto pelo recorrente arguido e, consequentemente, alterar parcialmente a decisão recorrida, condenando o
arguido B na pena de 7 (sete) anos
de prisão, na qualidade de cúmplice do crime de que vem acusado, no demais se
confirma.
Sem custas.
Registe e Notifique.
Lubango aos 22.09.2022.
A Relatora, Catarina Castro
1.º Juiz Adjunto, Amadeu Carlos
2.º Juiz Adjunto, Tânia André