Processo
053/2022
Relator
Dr. Bento Camenhe
Primeiro Adjunto
Dr. Adão Chiovo
Segundo Adjunto
Dr. Docílio Bento
Descritores:
Recurso Ordinário, Processo Penal 1ª Espécie, Tribunal da Comarca do Lubango - Peculato e concussão
Processo nº 053/2023
Arguido: A e B
ACÓRDÃO
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA
CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO LUBANGO, EM NOME DO POVO:
l. RELATÓRIO
Na 2ª Secção Criminal “A” do Tribunal da Comarca
de Moçâmedes, Província Judiciária do Namibe, foram pronunciados (fls. 769),
mediante acusação do Digno Magistrado do Ministério Público (fls. 637 a 644), os
arguidos:
1- A, casado, de
------- anos de idade, nascido em data não revelada nos autos, filho de -----------------
e de ---------------, natural de ---------------, Província do -----------------
e residente na cidade de ------------------, casa sem número (fls. 169); e
2- B, solteiro,
de ----------------- anos de idade, nascido a --------------- de ------------------
de -----------------, filho de -------------------- e de ---------------,
natural de ------------------, Província da -----------------, residente no
Município de ----------------, Província de --------------, bairro ---------------,
casa sem número (fls. 549). Como autores material de um crime de Peculato,
previsto e punível pelas disposições combinadas dos artigos 313º, 437º, e 421º,
nº 5 e um crime de concussão p.e p. pelo 314º todos do Código Penal de 1886.
Realizado o julgamento e respondidos os quesitos
que o integram, foi por acórdão de 2 de Março de 2023, julgada procedente e
provada a douta acusação, tendo sido os arguidos condenados nas penas de:
-A, 3
(três) anos de Prisão, no pagamento de kz. 200.000,00 (duzentos mil kwanzas) de
taxa de justiça e kz. 13.591.893,00 (treze milhões, quinhentos e noventa e um
mil, oitocentos e noventa e três kwanzas), a título de indemnização ao Estado
Angolano.
- B, 4
(quatro) anos de Prisão, no pagamento de kz. 200.000,00 (duzentos mil kwanzas)
de taxa de justiça e kz. 60.190.923,00 (sessenta milhões, cento e noventa mil,
novecentos e vinte e três kwanzas), a título de indemnização ao Estado
Angolano.
Desta decisão interpuseram recurso os Ilustres
Causídicos, por inconformação, nos termos dos artigos 459º e 469º, ambos do
Código de Processo Penal (fls. 907).
Admitido este (fls. 907), nas alegações
apresentadas (fls. 910 a 914), concluem requerendo a revogação da sentença
recorrida.
Nesta instância, ordenado o conhecimento do objecto de recurso e continuados os autos
com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, nos termos do artigo 482º,
nº 1 do Código do Processo Penal expendeu seu douto parecer, tendo em síntese
resumido o seguinte (fls. 979 a 980):
- Que seja declarado nulo o julgamento que
produziu o “acórdão” recorrido e que se realize novo julgamento tendo em conta
o estabelecido no artigo 53º nº 2 da Lei nº 29/22, de 29 de Agosto (Lei
Orgânica Sobre a Organização e Funcionamento dos Tribunais de Jurisdição
Comum).
II.
OBJECTO DO RECURSO
Sendo o âmbito e o objecto do recurso delimitados “para além das meras
razões de direito e das questões de conjunto oficioso” pelas conclusões
formuladas pelos recorrentes, nos termos dos art.ºs 660.º, nº 2; 664, 690º, nº
1, todos do Código de Processo Civil), conjugado com os artigos 464º, 465º,
ambos do Código de Processo Penal.
Considerando o contexto normativo e o teor das conclusões apresentadas pelo
recorrente, as questões que importa decidir são:
a) A revogação da sentença recorrida.
b) Absolvição do recorrente do crime de Peculato.
Mostram-se colhidos os vistos legais.
Importa, pois, apreciar e decidir.
***
III.
APRECIANDO
a)
Questão prévia.
Na prossecução dos autos, os mesmos foram com vista ao Digno Magistrado do
Mº Pº, nesta instância nos termos do nº 1 do artigo 482º do C.P.P. este, no seu
parecer de fls. 979 a 980, requereu que se declare nulo o julgamento que
produziu o acórdão recorrido, por aquele Tribunal não ter observado o artigo
53º nº 2 da Lei nº 29/22, de 29 de Agosto.
Ora, este artigo dispõe que “sem prejuízo do disposto no Código de Processo
Civil sobre a matéria, é obrigatória a constituição do tribunal colectivo nas
causas cíveis de valor superior ao dobro da alçada do Tribunal da Relação ou,
em matéria criminal quando se esteja perante Homicídios Qualificados ou sempre
que o crime seja punível com a pena de prisão superior a quinze anos”.
In
casu, os arguidos foram acusados e pronunciados pelos crimes de Peculato na
sua forma continuada p. e p. nos termos dos artigos 313º, 437º, 421º nº 5 e 55º
nº 3, cuja moldura penal nos termos desta norma, é de 12 a 16 anos de prisão
maior e outro de concussão p. e p. pelo artigo 314º, todos do Código Penal de
1886, este ultimo tem a moldura penal de 16 a 20 anos de prisão maior.
Neste conspecto, para a produção da prova dos crimes que respondem, o
Tribunal nos termos da actual Lei Orgânica Sobre a Organização e Funcionamento
dos Tribunais de Jurisdição Comum, é obrigatoriamente colectivo.
Compulsado os autos, verificamos que nas actas de audiência de discussão e
julgamento de fls. 831 a 839, 841 a 845, 868 a 870, 876, 907 e 907vº, o
Tribunal foi sempre singular, violando deste modo o preceituado na lei.
Portanto, segundo al. a) do nº 1 do artigo 140º do C. P. Penal, constitui
nulidade insanável a falta do número legal de juízes ou a violação das normas
que regulam a constituição do Tribunal.
Deste modo, é de se acolher o parecer do Mº Pº nesta instância.
Pelos fundamentos acima expostos os deste Tribunal decidem em anular o
julgamento, por não observar os ditames da lei, devendo baixar os autos ao
Tribunal a quo, para o cumprimento da lei adjectiva.
Apreciada e decidida esta questão a requerimento do Mº Pº, impede o
conhecimento do mérito da causa, ficando prejudicadas todas as questões
constantes do objecto do recurso que até esse momento não tenham sido
apreciadas conforme dispõe a 2ª e 3ª parte do nº 2 do artigo 660º do C.P.C.
IV.
DECISÃO
Nestes termos e nos demais de direito, os
desta Câmara, reunidos em conferencia, acordam em nome do povo em declarar nulo
o julgamento realizado, por inobservância das formalidades legais, devendo
baixar os autos para novo julgamento.
Sem custas.
Registe e notifique.
Cumpra o mais de lei.
Lubango,
aos 01 de Agosto de 2023.
O Juiz Relator; Bento Camenhe
1º adjunto; Adão Chiovo.
2º adjunto; Armando Do Amaral Gourgel