Processo
0002/2025-CIV3-A
Relator
Dr. Domingos A. Nahanga
Primeiro Adjunto
Dra. Marilene Camate
Segundo Adjunto
Dr. Lourenço José
Descritores:
Suspensão do despedimento, Valor da Acção, Inadmissibilidade do recurso, Artigo 29.º da CRA.
I. Quer na lei anterior (Lei nº 9/05, de 17 de Agosto), que fixava o valor da acção dos Tribunais de 1ª instância, em Kz. 704.000,00, quer na actual lei nº 5-A/2021, de 5 de Março (Lei que altera a lei sobre actualização das alçadas), que fixa o valor da alçada dos Tribunais da primeira instância em Kz. 3.080.000,00, não caberia qualquer guarida ao recurso da Agravante.
II. O despacho que admite o recurso, usa como pivô, o artigo 29º da CRA, cuja norma contém um princípio farol de salvaguarda do direito do cidadão de aceder, com todas as garantias, a justiça pronta e efectiva; sendo que a plena realização, implica a aplicação e cumprimento sistematizado de todo o direito positivo concorrente.
III. O titular da jurisdição não pode, sob capa do princípio da ampla defesa, e acesso ao direito e aos tribunais, insuflar expectativas jurídicas às partes, para além dos efeitos normais das decisões proferidas em acções, nos limites da alçada, nos termos das disposições combinadas do artigo 33º do Código de Processo do Trabalho e no número 1 do artigo 678º do CPC.
ACÓRDÃO
Processo n.º: 002/2025
Relator: Desembargador, Domingos Astrigildo Nahanga
Data do acórdão: 27 de Março de 2025
Votação: Unanimidade
Meio processual: Agravo
Decisão: Não conhecimento do objecto do recurso.
Palavras-chaves: suspensão do despedimento, valor da acção,
inadmissibilidade do recurso, Artigo 29.º da CRA.
Sumário do acórdão:
I. Quer na lei anterior (Lei nº 9/05, de 17 de Agosto), que
fixava o valor da acção dos Tribunais de 1ª instância, em Kz. 704.000,00, quer
na actual lei nº 5-A/2021, de 5 de Março (Lei
que altera a lei sobre actualização das alçadas), que fixa o valor da
alçada dos Tribunais da primeira instância em Kz. 3.080.000,00, não caberia
qualquer guarida ao recurso da Agravante.
II. O despacho que admite o
recurso, usa como pivô, o artigo 29º da CRA, cuja norma contém um princípio
farol de salvaguarda do direito do cidadão de aceder, com todas as garantias, a
justiça pronta e efectiva; sendo que a plena realização, implica a aplicação e
cumprimento sistematizado de todo o direito positivo concorrente.
III. O titular da jurisdição
não pode, sob capa do princípio da ampla defesa, e acesso ao direito e aos
tribunais, insuflar expectativas jurídicas às partes, para além dos efeitos
normais das decisões proferidas em acções, nos limites da alçada, nos termos
das disposições combinadas do artigo 33º do Código de Processo do Trabalho e no
número 1 do artigo 678º do CPC.
Os Juízes da Câmara do Cível do
Tribunal da Relação do Lubango, reunidos em conferência, em nome do Povo
acordam:
I – RELATÓRIO:
No Tribunal
de Comarca do Lubango, a Empresa CN, com sede na Província da Huíla, cidade do
Lubango, Estrada da Mapunda, (…) com NIF (…), matrícula comercial nº (…), notificada
do despacho sobre a Providência Cautelar Especificada de Suspensão do Despedimento
Disciplinar, em que é requerente AJ, solteiro nascido em 18 de Agosto de 1990,
natural do Lubango e residente na Centralidade da Quilemba, utente do telemóvel
nº (…), veio interpor recurso em 21.10.2024, conforme termo de fls. 226.
O recurso,
sendo um mecanismo ao alcance de quem tenha sido vencido, tem sempre a vocação
de ver reapreciada a decisão que se impugna, no sentido de acomodar a pretensão
inconformada.
O regime das normas é inflexível, quanto a sua
admissibilidade em relação ao valor da acção, como se depreende nos termos
conjugados dos artigos 462º e 678º/1 e nos artigos 680º, 685º/1, 687/1 e 690º,
todas do CPC.
Todavia, a providência cuja decisão se pretende ver
alterada em juízo de recurso foi valorada na primeira instância em Kz. 670.098,67
(seiscentos e setenta mil, noventa e oito kwanzas e sessenta e sete cêntimos),
conforme se vê na cópia da P.I. de fls. 3 e oposição de fls. 44 e não tendo
sido alterado em momento algum da lide.
Quer na lei anterior (Lei nº 9/05, de
17 de Agosto), que fixava o valor da acção dos Tribunais de 1ª instância, em
Kz. 704.000,00, quer na actual lei nº 5-A/2021, de 5 de Março (Lei que altera a lei sobre actualização das
alçadas), que fixa o valor da alçada dos Tribunais da primeira instância em
Kz. 3.080.000,00, não caberia qualquer guarida ao recurso da Agravante.
Se o Recorrente abriu a instância de recurso, atempadamente
após notificação da decisão; porém, não basta ser parte legítima, ou “madrugador”
na interposição do recurso. De nada serve o dever de diligência que se tenha
tido, se a utilidade económica do objecto da acção ou providência, de que se
pretende ver acautelado o direito na instância de recurso, couber na alçada do
Tribunal Recorrido; não sendo a situação coberta nos termos no número 1 do
artigo 475º do CPC, é irrelevante o valor da acção.
Os processos, até a proferição da decisão
com trânsito em julgado têm um ritual de actos a seguir ou assim não sendo,
vêm-se viciados.
O titular da jurisdição
não pode, sob capa do princípio da ampla defesa, e acesso ao direito e aos
tribunais, insuflar expectativas jurídicas às partes, para além dos efeitos
normais das decisões proferidas em acções, nos limites da alçada, nos termos
das disposições combinadas do artigo 33º do Código de Processo do Trabalho e no
número 1 do artigo 678º do CPC.
Não se pode a pretexto da ampla defensoria e acesso ao
direito e aos tribunais, interpretar-se o artigo 29º da Constituição da
República de Angola (CRA), a ponto de torná-lo numa avenida, para a romaria de recursos
infindáveis.
As normas processuais, cujo regime disciplina os actos e
a intervenção das partes principais, incidental e o titular da jurisdição, não
devem ser preteridas; esgotadas que estiverem as prerrogativas para o efeito.
Entender de forma fragmentada, o princípio contido no
aludido artigo da CRA é desvirtuar o cerne da justiça, seja ela adjectiva seja substantiva.
Este princípio, sempre carecerá de concretização casuística, atento a situação;
sob pena de, na ânsia de se perseguir a justiça material, dar-se azo, a que
penda em instâncias superiores, um enfileirado interminável de recursos, de
todo, inadmissíveis.
Os tribunais de recurso foram pensados para corrigirem na
cadeia e ordem em que estão inseridas, as decisões das instâncias anteriores,
atento, antes, a observância estricta do direito adjectivo.
Se às partes, podendo ser-lhes assacados os efeitos por
não cumprimento das normas processuais, no âmbito do seu livre arbítrio, já ao titular
da jurisdição impende o dever legal do cumprimento escrupuloso; não importando
o livre juízo subjectivo que tenha; tal como impõe as normas previstas no
número 2 do artigo 8º e 2 e 3 do artigo 9º, todos do CC, a que o juiz está
adstrito.
O despacho de fls. 229,
que admite o recurso, usa como pivô, o artigo 29º da CRA, cuja norma contém um
princípio farol de salvaguarda do direito do cidadão de aceder, com todas as
garantias, a justiça pronta e efectiva; sendo que a plena realização, implica a
aplicação e cumprimento sistematizado de todo o direito positivo concorrente.
Se por hipótese, havia algum escape para este salto, isto deveria ser atempadamente
acautelado, pelas partes, querendo, nos articulados, fase em que lhes é
permitido ou pelo juiz, na sentença, respectivamente, ao abrigo dos artigos
315º e 318º do CPC. Não sendo assim; é um esforço inglório admitir o recurso.
Não basta, por si só, a boa intenção de realizar a
justiça, se esta não se fundar na correcção processual e nos limites ex officio do julgador. E mais, depois
de prolatada a decisão, que põe termo a acção.
As partes quando pleiteiam em juízo têm em conta a
segurança e a certeza jurídica, a definitividade dos actos e o esgotamento do
poder do juiz da causa.
Dito doutra forma, a força e os efeitos dos actos ou
omissões processuais, não podem estar a mercê dos sujeitos processuais, não
estando sob umbrella dos artigos
264º/2 e 266º do CPC ou 29º da CRA. De resto, das anotações feitas ao artigo
29º da CRA, pelos Professores Doutores Raul Carlos Vasques Araújo e Elisa
Rangel Munes in CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA DE ANGOLA, Anotada, Tomo I, 2014, p. 274 e 275 e verso, não resulta
qualquer entendimento diferente do aqui vertido.
Por todas as razões que antecedem, a pretensão da Recorrente é por esta via náufraga, por
inadmissibilidade, decorrente de um vício precedente, qual seja, a
insuficiência do valor da acção, por força das disposições combinadas do número
1 do artigo 678º do CPC e número 1 do artigo 2º da Lei nº 5-A/21, de 5 de
Março.
Os processos estão
sujeitos a custas, decorrentes da responsabilidade de quem dá causa a acção ou
dela tira proveito, por força das disposições conjugadas do nº 1 do artigo 446º
do CPC, e do artigo 1º do Código das Custas Judiciais. No caso e, em sede de
recurso, tal responsabilidade deve ser ombreada pela Agravante, nos termos do
artigo 446º nº1/1ª parte do CPC.
Assim, com os fundamentos acima expendidos, eis o momento de proferir;
II- DECISÃO:
Nestes termos, os Juízes desta Câmara acordam, em não conhecer o objecto do
presente recurso, por inadmissibilidade.
Custas pela Agravante.
Registe e notifique.
Lubango, 27 de Março de 2025
Os Juízes Desembargadores
Relator: Domingos Astrigildo Nahanga
1.º Adjunto: Marilene Camate
2.º Adjunto: Lourenço José