Processo
0028/2023-CIV1-A
Relator
Dr. Domingos A. Nahanga
Primeiro Adjunto
Dra. Marilene Camate
Segundo Adjunto
Dr. Lourenço José
Descritores:
Contrato de mútuo. Pagamento do capital e juros. Prescrição. Efeitos. Obrigação natural.
I- A prescrição não pode amparar condutas de quem, pretendendo por todos os meios furtar-se da obrigação; coloca-se numa situação de falência ou insolvência ou estando efectivamente numa destas situações fortuitas; nada faz para o cumprimento do crédito, ou pelo menos renegociá-lo, porque imbuído da esperança de ver o manto da prescrição cobri-lo.
II- A moratória tácita ou a boa fé do credor, não pode ser vista, como negligência desencadeadora do livramento da obrigação, por prescrição. Diferente seria se o pagamento da dívida não tivesse sido iniciado e o credor nunca tivesse agido no sentido de recuperar o crédito concedido. Tendo iniciado o pagamento, a obrigação ficou materialmente concretizada e toda a atitude relapsa posterior, não corta o vínculo obrigacional estabelecido, para a continuidade do pagamento das parcelas restantes e em mora; a não ser que houvesse perdão parcial ou total da dívida concedida pelo credor; o que não é a situação.
III- Só há verdadeiramente prescrição se da atitude do credor se puder retirar razoavelmente algum desinteresse expresso ou tácito de perdoar a dívida. De contrário seria uma truculência defender a prescrição, nos moldes em que se faz, dada a sua nocividade para o ambiente de negócio.
IV- Defender e validar a teoria de que o devedor relapso ante o incumprimento deliberado deve beneficiar da prescrição nos moldes que é trazida nos autos, diante de todos os factos verificados na execução do contrato de mútuo é tentar passar a ideia do desvalor do crédito, como instrumento de financiamento e, os devedores, como actores desobrigados, a coberto de tudo vale!
V- Os agentes devem ter a honra, nos compromissos que assumem e, na qualidade de “motores” da economia e do desenvolvimento das sociedades em que estão inseridos. A sua acção deve ser guiada pelos mais nobres valores do tráfico comercial- a confiança e a boa fé. Não devem, com a sua conduta, criar descrença no mais importante instrumento que constitui a alavanca para o emprego e bom desempenho da economia e da sociedade.
ACÓRDÃO
Processo
n.º: 028/2023
Relator: Desembargador, Domingos
Astrigildo Nahanga
Data do acórdão: 24 de Abril
de 2025
Votação: Unanimidade
Meio processual: Apelação
Decisão: confirmada a decisão recorrida.
Palavras-chaves: Contrato
de mútuo, pagamento do capital e juros, prescrição, efeitos, obrigação natural;
Sumário do acórdão:
I- A prescrição não pode
amparar condutas de quem, pretendendo por todos os meios furtar-se da
obrigação; coloca-se numa situação de falência ou insolvência ou estando
efectivamente numa destas situações fortuitas; nada faz para o cumprimento do
crédito, ou pelo menos renegociá-lo, porque imbuído da esperança de ver o manto
da prescrição cobri-lo.
II- A moratória tácita ou a boa fé do credor, não pode
ser vista, como negligência desencadeadora do livramento da obrigação, por
prescrição. Diferente seria se o
pagamento da dívida não tivesse sido iniciado e o credor nunca tivesse agido no
sentido de recuperar o crédito concedido. Tendo iniciado o pagamento, a
obrigação ficou materialmente concretizada e toda a atitude relapsa posterior,
não corta o vínculo obrigacional estabelecido, para a continuidade do pagamento
das parcelas restantes e em mora; a não ser que houvesse perdão parcial
ou total da dívida concedida pelo credor; o que não é a situação.
III- Só há verdadeiramente prescrição se da atitude do
credor se puder retirar razoavelmente algum desinteresse expresso ou tácito de
perdoar a dívida. De contrário seria uma truculência defender a prescrição, nos
moldes em que se faz, dada a sua nocividade para o ambiente de negócio.
IV- Defender e validar
a teoria de que o devedor relapso ante o incumprimento deliberado deve
beneficiar da prescrição nos moldes que é trazida nos autos, diante de todos os
factos verificados na execução do contrato de mútuo é tentar passar a ideia do
desvalor do crédito, como instrumento de financiamento e, os devedores, como
actores desobrigados, a coberto de tudo vale!
V- Os agentes devem ter
a honra, nos compromissos que assumem e, na qualidade de “motores” da economia
e do desenvolvimento das sociedades em que estão inseridos. A sua acção deve
ser guiada pelos mais nobres valores do tráfico comercial- a confiança e a boa fé. Não devem, com a sua conduta, criar descrença no mais
importante instrumento que constitui a alavanca para o emprego e bom desempenho
da economia e da sociedade.
* * *
Os
Juízes da Câmara do Cível, Administrativo, Fiscal e Aduaneiro do Tribunal da Relação,
acordam em nome do povo:
I. RELATÓRIO.
Na Sala do Cível e Administrativo do Tribunal
de Comarca do Lubango, FM, solteiro, natural da Província da
Huíla, residente nesta cidade do Lubango, Bairro Hélder Neto, casa n.º 63, com
o terminal telefónico n.º 923930785; deduziu Embargo de Executado na Acção
Executiva para Pagamento de Quantia Certa, contra:
Banco
X, com sede social na Província de Luanda, Município do Talatona, no
Gaveto da Avenida (…), via (…), representada pelos Srs. GX e PX; requerendo:
1-
A procedência dos embargos de executado, de acordo ao artigo 812.º
e 815.º do CPC;
2-
A procedência da excepção da prescrição, absolvendo-se a executada
integralmente do pedido ou;
3-
A procedência da excepção
peremptória extintiva da prescrição dos juros, absolvendo-se a executada
parcialmente do pedido;
4-
A condenação no pagamento das custas e procuradoria condigna e
honorários do Advogado do embargante;
5-
A suspensão da presente execução mediante prestação de caução, por
parte do embargante ao abrigo do artigo 818.º n.º 1 do CPC;
Do conteúdo vertido nos embargos de executado, veio o Embargado
apresentar contestação de fls. 26 a 33; em resposta, peticionando a
improcedência dos embargos;
Ordenada a tentativa de conciliação, a mesma foi realizada (acta de
fls. 52 a 55) e posteriormente proferido Saneador Sentença, de fls. 61 a 66,
que julgou parcialmente procedente a excepção da prescrição, no que diz respeito
ao pagamento dos juros contabilizados para além dos cinco anos anteriores a
instauração da presente acção e, absolveu o Embargado dos demais pedidos.
Notificadas as partes da Sentença e não se conformando, o Embargante veio interpor recurso (fls.
71) e o Embargado requerer aclaração da Sentença, sendo que o primeiro foi
admitido por despacho de fls. 73.
Entregues os autos nesta instância de recurso
e feita a revisão, foi proferido despacho nos termos do artigo 701º do CPC, recebendo-se
o recurso como sendo próprio e com o efeito atribuído (fls. 115).
Em alegações de
recurso, a Apelante, em fls. 95 a 98, veio apresentar as seguintes conclusões:
- O lapso
temporal pode desencadear a extinção de direitos e no caso concreto releva-nos
o instituto da prescrição prevista no artigo 300.º do C.C. Que o capital como
os juros do contrato de crédito hipotecário celebrado entre o Apelante e a
Apelada, em 30 de Março de 2007, já se encontravam prescritos a data da
interposição da acção em juízo, em 24 de Julho de 2020;
- A prescrição
não se deu unicamente em relação aos juros para além dos cinco anos anteriores
a instauração da acção executiva, como julgou o Tribunal a quo, como também do respectivo capital e demais juros, porquanto,
ambos ficam sujeitos ao mesmo regime de prazos e jamais podem ter soluções
distintas como entendeu o Tribunal a quo;
- Verificou-se o
incumprimento da prestação por parte do Apelante, situação que levou o
vencimento de todas as prestações nos termos do artigo 781.º do C.C, cuja data,
salvo melhor entendimento, deve ser levada em consideração para o início da
contagem do prazo da prescrição nos termos do artigo 302.º do CC;
- Que a
verificação do vencimento de todas as prestações não é suficiente para a
alteração do regime da obrigação e continua assim sujeita ao prazo quinquenal
da prescrição do capital e juros;
- Entretanto,
esta data precisa ser determinada, pese embora a própria apelada fê-lo no seu
ofício de fls. 40 e, referiu que o incumprimento se deu desde 16 de Novembro de
2008. Porém, não sendo esta a data atendida, necessariamente será a data de 22
de Setembro de 2009;
- Desde 2009 até
Fevereiro de 2015, não houve qualquer facto que pudesse levar à interrupção da prescrição
do capital e juros de crédito, então celebrado pela Apelante e Apelado;
- No ano de 2012
o Apelante simplesmente recebeu a comunicação que estava em incumprimento do
crédito que tinha com o Apelado não tendo manifestado qualquer declaração de vontade
nesta altura;
- Os eventuais
pagamentos efectuados no ano de 2014 por parte do Apelante, não estão
suficientemente provados nos autos e no nosso entendimento o Tribunal a quo, deveria levar este facto ao Questionário
de modo a que pudesse em audiência de discussão e julgamento provar-se e não
fazer directamente Despacho Saneador-Sentença, como aconteceu;
- Outrossim,
quanto a interpelação extrajudicial efectuada em 2014, não se afigurou como
instrumento idóneo para a interrupção dos prazos da prescrição e efectivamente
bem julgou o Tribunal a quo, pelo
que, continuavam a correr com toda a normalidade os respectivos prazos;
- Assim, todo e
qualquer compromisso efectuado pelo Apelante depois da data de 2015, fê-lo na
assunção de uma obrigação natural, uma vez que, quer o capital como os
respectivos juros já estavam há muito prescritos, sendo legítimo ao Apelante
negar o seu cumprimento nos termos do artigo 304.º n.º 1 do CC;
Em
contra-alegações de fls.128 a 131, o Apelado veio concluir nos seguintes
termos:
-Da análise às
alegações, não se vislumbra nas conclusões qualquer referência a alegada norma
jurídica violada que justifique o recurso interposto, pelo que, se requer que o
Recorrente seja convidado a corrigir tal vício, para os devidos efeitos legais,
sob pena de não conhecimento do recurso e consequente extinção da instância
recursiva;
- As alegações
cingem-se na questão relativa à prescrição do crédito reclamado pelo Apelado,
que na perspectiva do Apelante, quer o capital, quer os juros do respectivo capital,
se encontram prescritos; uma vez que, à data da instauração da execução, já
decorreram os cinco (5) anos estabelecidos por lei, o que lhe permite recusar o
cumprimento coercivo do crédito;
- Nenhum
direito, quer o crédito, quer o capital à data da instauração da execução se
encontram prescritos; visto que, conforme extrato bancário junto nos autos, o
Apelante passou a pagar o crédito em 2008 de forma significativamente
irregular, isto é, pagou uma prestação em 20.04.2008, as seguintes em
03.06.2008, 30.06.2008 e em 16.09.2008; bem como em 2009, o Apelante manteve o
pagamento do crédito de forma irregular, pagando uma prestação em 14.01.2009, e
as seguintes em 08.06.2009 e em 22.09.2009;
- Face o
incumprimento, o Apelado interpelou o Apelante por carta datada de 19.03.2012,
que a recepcionou em 14.03.2012, motivo pelo qual, no período de 2014 o
Apelante efectuou alguns depósitos até Março de 2014, deixando assim de cumprir
mais uma vez o pagamento dos créditos.
- Em Maio de
2014, foram efectuadas várias interpelações quer a título de chamadas
telefónicas como em reuniões, nas quais o Apelante sempre assumiu e reconheceu
a dívida e, onde garantia que pagaria o crédito com recursos a valores de um
serviço prestado ao Estado; acto sucessivo, numa nova carta de 14.08.2019
dirigida ao Apelado, o Recorrente novamente comprometeu-se em pagar o crédito
com depósitos mensais no valor de 20.000,00 (vinte mil kwanzas); reconhecendo
de igual modo a dívida creditícia a favor do Apelado;
- No seguimento
dos depósitos efectuados pelo Apelante até Março de 2014, bem como a assunção
sucessiva e reiterada da dívida do crédito e o consequente reconhecimento do
seu pagamento até Março de 2014, isto é, Março e Maio de 2014, pelas cartas de
23.02.2015 e 14.08.2019; nenhum direito à cobrança judicial do Apelado se
encontrava prescrito, ou seja, o Apelado poderia sempre efectuar a cobrança
judicial do seu crédito contra o Apelante até 14.08.2024.
- Não há
qualquer prescrição do direito de crédito do Apelado à data da instauração da
execução, devendo ser ordenado o prosseguimento da execução com vista ao
pagamento do crédito exequendo a favor do Apelado.
Aberta vista ao MºPº, este veio em suma, promover no sentido de não
dar provimento ao presente recurso e em consequência que se mantenha a decisão
recorrida (fls. 134 a 137).
Posto isso,
seguiram-se os vistos sucessivos aos Juízes adjuntos (fls. 138 e verso).
* * *
II. OBJECTO DO RECURSO
Face as conclusões apresentadas
pelo agravante, que delimitam o objecto do recurso, para além das excepções de
conhecimento oficioso, que decorrem do disposto nos artigos 660º nº 2, 664º,
684º nº 3 e 690 nº1, todos do Código de Processo Civil; emerge como questão a
apreciar e decidir em sede do presente recurso, a seguinte:
-
Há prescrição do dever ao pagamento do capital cedido por empréstimo e
respectivos juros?
* * *
III. FUNDAMENTO DE FACTO
A
justiça não pode sucumbir diante de factos tão flagrantes que reclamam atenção.
Sob amparo do poder de cognição atribuído ao Tribunal da Relação, à luz do
artigo 715º do CPC; tem-se por factos provados, de que se extraem da crítica
feita na decisão recorrida em fls. 63 e, em outras partes dos autos, os
seguintes:
1.
O Embargante endereçou uma carta ao BX, pedindo a concessão de um
crédito no valor em USD 25.000,00 (vinte e cinco mil Dólares Americanos) fls.
84;
2.
No dia 9 de Abril de 2007, entre as partes foi celebrado um
contrato de concessão de crédito no valor em Kz. 2.070.000,00 (dois milhões e
setenta mil Kwanzas), num contravalor em USD 25.000,00 (vinte e cinco mil
Dólares Americanos) com juros fixados em 12% (fls. 10);
3.
Para o reembolso da dívida a ser feita pelo Embargante foi
estipulado um total de 48 prestações mensais (mesmo documento);
4.
As prestações foram feitas pelo Embargante de forma irregular, num
número não superior a 4.
5.
O Embargante deixou de cumprir as suas obrigações em Março de 2014;
6.
O BX notificou ao Embargante alertando-o sobre a situação do
financiamento concedido e seu vencimento para o regularizar tendo em resposta
assumido a dívida, mediante termo de compromisso (doc.-fls. 17 e 18);
7.
Em 23 de Fevereiro de 2015, o Embargante endereçou ao BX uma carta
comprometendo regularizar a dívida (doc. - fls. 41);
8.
Em 14 de Agosto de 2019 o Embargante endereçou uma carta ao BX
assumindo a responsabilidade do crédito e comprometendo-se efectuar depósitos
mensais no valor em Kz. 20.000,00 (vinte mil) conforme documento de fls. 43;
9.
Em 03 de Setembro de 2019, o BX fez uma interpelação ao Embargante
expressando a vontade de resolver o contrato de mútuo e com a liquidação da
dívida (doc.-fls. 44 e 45).
* * *
IV. APRECIANDO
Antes
de atentarmos à questão fundamental suscitada em recurso, debrucemo-nos, sobre as
seguintes questões prévias:
1.
Sobreposição de recursos e
despachos
Proferida a sentença e notificado o Embargante veio interpor
recurso de apelação mediante requerimento de fls. 71, admitido a fls. 71 e 73;
No entanto, em fls. 81, veio o juiz proferir despacho de deserção,
por falta de alegações;
Acto subsequente, o Recorrente inconformado com o despacho que
declara deserto o recurso, por falta de alegações, veio interpor outro recurso
de agravo, sobre este despacho, conforme fls. 85; recurso, este, que foi admitido
por despacho de fls. 86, como agravo, subida imediata e efeitos suspensivos;
Porém, apresentadas as alegações do último recurso, conforme
fls. 95, 96, 97 e 98, o Meritíssimo
juiz, em “despacho de reparação de agravo veio dar sem efeito o
despacho de fls. 81, que declarava deserto o recurso primitivo, isto é, o
recurso interposto da sentença;
A questão que se suscita, atento aos actos ocorridos na tramitação
do processo tem a ver com a correcção processual;
Ora, interposto o recurso sobre a decisão, o mesmo foi admitido
como apelação e em acto subsequente declarado deserto por falta de alegações;
quando nos termos do número 1 do artigo 699º do CPC, é uma faculdade da parte Recorrente,
alegar ou não alegar na primeira instância.
Se não foi requerido consulta nem confiança do processo, nada
indicava que o Recorrente fosse alegar naquela instância. Pois, não se tratando
de recurso de agravo, não lhe é imposta a sanção de deserção do recurso, por
falta de alegações, como foi inicialmente decidido;
Admitindo a hipótese de ter havido, por mero lapso, uma desatenção
no ajuizamento, que conduziu à deserção, de resto, nada de extraordinário, se
tiver em conta, a possível pendência na primeira instância; já importa olhar
para o recurso subsequente de Agravo, admitido sobre o despacho de deserção;
Os actos do juiz podem ser reclamados e recorridos, dependendo dos
efeitos que tenham quer nos direitos em causa quer na tramitação normal; sendo
no primeiro caso, vinculativos e no segundo, despachos de mero expediente ou do
poder discricionário, nos
termos do artigo 679º do CPC.
O despacho de deserção tem o condão de inviabilizar a realização de
um direito que reclama reapreciação em outra instância; já que poderá equivaler
mutatis mutandi à retenção; este acto só pode ser atacado por via do incidente de Reclamação, previsto
no artigo 688º do CPC, e não mediante outro recurso, como foi no caso;
Se as partes, dado o vasto terreno de liberdade processual que têm,
podem pedir ao titular da jurisdição o que lhes aprouver, salvo limitações
previstas no número 2 do artigo 264º do CPC; já que ao juiz incumbe o dever
disciplinar de bem conduzir o processo, advertindo e sancionando os prevaricadores
processuais ou incidentais, nos termos do artigo 266º do Código em referência e
38º do Código das Custas Judiciais. Dito doutro modo, quer a parte recorrente,
quer o juiz da causa enveredaram por uma tramitação processual anómala, de que
se impunha correcção;
Na sequência desta tramitação e por efeito da inutilização do
despacho de deserção de fls.81, com a reparação do agravo, houve repristinação
do primeiro recurso de Apelação, atento ao despacho de fls. 100, o que era, de
todo, evitável.
2.
Pedido de Aclaração da sentença:
Outrossim, proferida a sentença de fls. 61 a 66, foi o embargado
notificado, tendo vindo, em seguida, pedir aclaração da sentença, conforme
requerimento de fl. 72, incorporados nos autos, mediante termo de juntada, com
a devida referência;
Porém, conclusos os autos, conforme fls.73, em momento algum,
posterior, houve pronunciamento do juiz, em relação ao pedido de aclaração;
Ora, sendo certo que o poder do juiz se extingue com a prolação da
sentença, por força do número 1 do artigo 666º do CPC; todavia, havendo
ininteligibilidade, obscuridade ou ambiguidade no decidido, as partes,
querendo, podem instar o juiz da causa a sanar as dúvidas sobre a sentença, nos
termos da alínea a) do artigo 669º do mesmo Código;
Se a inquietação foi a dificuldade de perceber a sentença, no todo
ou em parte; tal dificuldade, em condições normais, obstaria a que se subtraísse
da decisão as razões, quer de facto, quer de direito ou ainda o sentido e, em
consequência disso, não se pudesse validamente refutar o julgamento feito.
Visto doutra forma, a não clarificação da decisão pode inibir de
certa maneira, a que se exerça eficazmente a defesa do direito e a justiça, que
a parte pretende, em fase do recurso, independente do subjectivismo, que lhe
está associado;
A toda pretensão levada ao juiz pelas partes, deve sobre ela recair
o pronunciamento do julgador, sob pena de denegação da justiça, a que o juiz
está vedado, por força da alínea d) do artigo 668º do mesmo Código; já que a
omissão de pronúncia, em relação a aclaração
pedida sobre a decisão, pode ter o condão de viciar a sentença, pelo menos, na
sua interpretação; visto que, da aclaração
pode resultar a pretensão de recorrer ou conformar-se com o decidido.
No caso, a falta de aclaração omitida só se irreleva, pelo facto de
a omissão não ter sido perseguida nas alegações do Recorrente e os autos terem,
na mesma, subido em recurso.
Ora, tendo sido interposto recurso, qualquer efeito resultante da
omissão do juiz sobre a aclaração, de
que pudesse resultar recurso, ficou inutilizado, na presente situação, pelo
facto de, na mesma, os autos terem subido ao tribunal ad quem;
No entanto, importa sublinhar que, a referida inutilização
superveniente, não afasta à luz do número 2/2ª parte do artigo 660º do CPC, o
dever oficioso desta instância, de fazer o devido reparo ao julgador a quo;
Em suma, o juiz não pode deixar de tomar posição, no que lhe é pedido
no processo (deferindo ou indeferindo). Este é o ónus do julgador, a que não se
deve eximir, por força das disposições combinadas dos artigos 158º e alínea d)
do 668º, todos do CPC.
3.
Estrutura da sentença
As decisões judiciais, que tomem a designação de sentença ou
acórdão, salvo, algumas excepções, devem preencher os requisitos externos, da
estrutura prevista no artigo 659º do CPC;
A Sentença de que se recorre, em fls. 61 a 66, e atento a questão dicidenda, não tem nela inserida, a
descrição compartimetarizada dos factos provados, pela primeira instância, de
forma a que se possa inferir, sem ambiguidades, os factos em que assenta, para
se concluir com a decisão proferida;
Qualquer análise que tenha sido feita pelo julgador; sendo certo
que deve ter-se fundado em alguma factualidade; ela deve, todavia, ser extraída
dentre os vários factos, com relevância para a decisão, mediante feitura de um rol
de elementos cronologicamente ordenados e facilmente identificáveis nos fundamentos, o que não foi feito;
Se, em condições normais, tal omissão poderia reconduzir-se a
nulidade da sentença, nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 668º; essa
consequência não se accionará no presente caso. Primeiro, pelo factor tempo, segundo porque, sendo a prova
para este caso baseada em documentos; a falta apontada poderia sempre ser
suprida, por este Tribunal, ao abrigo do artigo 715º do CPC. De resto, via, que
mais contende à apronta pronúncia da justiça do caso, ao invés de protelá-la.
* * *
Posto
isso e, fixando-se nos factos carreados nos autos, importa responder à questão,
objecto do recurso:
-
Há prescrição do dever ao pagamento do capital cedido por empréstimo e
respectivos juros?
O
conflito entre as partes resulta da relação estabelecida no âmbito do contrato de
crédito, entre o Banco X (…) e o Recorrente, no valor em Kwanzas 2.070.000,00
(dois milhões e setenta mil Kwanzas), equivalentes na altura, em USD 25.000,00 (vinte e cinco mil Dólares
Americanos), à taxa de 12%, em 48 prestações mensais, cujo fim era a compra de
uma viatura usada conforme fls.10 e verso, a pedido do Embargante recorrente,
conforme fls. 34.
O
Apelante vem alegar em defesa da sua posição, que a obrigação do pagamento da
dívida resultante da relação creditícia, que contraiu ao Banco BX, está
prescrita, não sendo jamais exigível, pelo facto de a interpelação extrajudicial
ter sido feita numa altura em que já teriam decorrido mais de 8 anos após prazo
estipulado para o cumprimento das prestações parcelares, referentes ao crédito
em 48 meses, cuja última venceria a 30 de Março de 2011.
E mais, que a prescrição não se deu unicamente
em relação aos juros, para além dos cinco anos anteriores a instauração da
acção executiva, como julgou o Tribunal a
quo, mas também em
relação ao respectivo capital e demais juros, porquanto, ambos ficam sujeitos
ao mesmo regime de prazos.
O
BX-Embargado, em contra posição veio alegar
que, no seguimento dos depósitos efectuados pelo Apelante até Março de
2014, bem como a assunção sucessiva e reiterada da dívida do crédito e o
consequente reconhecimento do seu pagamento até Março de 2014, isto é, Março e
Maio de 2014, pelas cartas de 23.02.2015 e 14.08.2019; nenhum direito à
cobrança judicial do Embargante se encontrava prescrito, ou seja, o Embargado
poderia sempre efetuar a cobrança judicial do seu crédito contra o devedor até
14.08.2024.
Depreende-se
que o cavalo de batalha trazido pelo Apelante é a prescrição, do
crédito e respectivos juros, fundada no alegado decurso de mais de 20 anos, desde
a constituição do crédito e 8 anos, desde última parcela paga e a interpelação
extrajudicial.
Contudo,
importa antes, olhar para o invocado Instituto da prescrição.
No
âmbito dos direitos disponíveis, poderá ocorrer situações em que determinados
interesses baseados em direitos, não possam ser perseguidos pela verificação da
inacção do titular do direito, sobre outrem, no tempo estipulado para que o
obrigado se veja compelido a praticar o facto devido, a favor do credor do
direito.
Se
a invocação da prescrição, não sendo oficiosa, é uma prerrogativa de quem tem
nisso interesse e; não sendo exigida dentro de certo tempo, por quem tem
legitimidade; ver-se-á o mesmo direito destruído, sem qualquer poder de produzir
efeitos na esfera jurídica e patrimonial do relapso; estaremos diante da
prescrição, cujo regime está previsto nos artigos 300º e seguintes do CC.
O
contrato de crédito previu respectivamente, a forma de reembolso do crédito
cedido, na cláusula 2ª, a periodicidade do vencimento de juros e a obrigação do
devedor manter a conta devidamente provisionada, para efeitos de débito da
parcela, na clausula 4ª, (fls. 10 v).
O
Apelante-devedor deixou de cumprir com as suas obrigações e quando o fez,
fazia-o irregularmente, conforme demostra o extracto da conta corrente
(fls. 13 a 16 e 35 a 38).
No caso, há:
1.
um
contrato de concessão de crédito;
2.
alguns
pagamentos efectuados para amortização da dívida;
3.
reconhecimento
desta mesma dívida;
4.
interpelação
feita pelo credor ao devedor;
5.
termo de compromisso;
6.
interpelação por incumprimento –
conforme fls. 10 a 18, 40 e 41.
Diante
dos factos documentados nos autos, fica claro que as obrigações do devedor com
o credor, não foram cumpridas nos termos contratualizados.
Ora, mesmo que por hipótese se aventasse a prescrição;
a partir da altura em que o devedor acusando a recepção da correspondência do
banco, afirma em continuar vinculado à obrigação, comprometendo-se a honrar as
prestações, no valor mensal em Kz 20.000,00 (vinte mil), conforme Termo
de compromisso, datada em 14 de Agosto de 2019 (fls. 18), e pagas
efectivamente algumas prestações inutilizou quaisquer efeitos da invocada prescrição,
atento no disposto no artigo 325º do C.C.
A
moratória tácita ou a boa fé do credor, não pode ser vista, como negligência
desencadeadora do livramento da obrigação, por prescrição.
Diferente seria se o pagamento da dívida não
tivesse sido iniciado e o credor nunca tivesse agido no sentido de recuperar o
crédito concedido.
Tendo iniciado o pagamento, a obrigação ficou
materialmente concretizada e toda a atitude relapsa posterior, não corta o
vínculo obrigacional estabelecido, para a continuidade do pagamento das
parcelas restantes e em mora. A não ser que houvesse perdão parcial
ou total da dívida concedida pelo credor; o que não é a situação.
Se,
no caso presente constituísse um direito, furtar-se das obrigações
constituídas, no âmbito da liberdade de contratação creditícia, invocando-se
a prescrição e, depois de reconhecida a obrigação; então há que rever os
valores da justiça, e a boa fé dos agentes actuantes no mercado, se, se
pretende, de alguma forma, incutir alguma sanidade comportamental no mercado
financeiro.
Só há verdadeiramente prescrição se da atitude
do credor se puder retirar razoavelmente algum desinteresse expresso ou tácito
de perdoar a dívida. De contrário seria uma truculência defender a prescrição,
nos moldes em que se faz, dada a sua nocividade para o ambiente de negócio.
Não importa em que âmbito de disponibilidade
das partes esteja o crédito; o certo é que haverá comportamentos de devedores,
com implicações nefastas para a economia. E minar a confiança dos operadores do
mercado é o que menos se espera.
Aliás, a prática deveria alertar quem
enverede pelo caminho furtivo das obrigações creditícias, que da sua conduta
resulta o crédito inadimplente ou aquilo que na gíria bancária é conhecido por crédito malparado, inibidora da concessão de novos créditos no
mercado.
a) Em relação a alegada obrigação
natural quanto ao crédito contraído.
Por outro lado, o Apelante alega ainda, que
na pior das hipóteses, não tendo a dívida sido cobrada dentro de certo prazo, a
mesma deixou de ser legalmente exigível passando a ser, quando muito, uma
obrigação natural.
A
questão é: o Apelante, diante do crédito
não cobrado a tempo, encontrar-se-ia no cumprimento de uma obrigação natural?
Dispõe o artigo 402º do CC: “A obrigação diz-se natural, quando se funda
num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é juridicamente
exigível, mas correspondente a um dever de justiça”.
Parte-se do princípio de que a obrigação
natural é aquela em que, havendo sujeição a um dever de agir, praticar um acto,
ou tomar uma atitude para com outrem; a sua falta, não sujeita ao omitente,
qualquer consequência jurídica exigível; só sendo moralmente censurável.
Seja como for, tudo que seja legal é na
essência uma obrigação natural, diferindo tão só, na forma da
sua exigibilidade. Mas daí tentar esquivar-se do cumprimento com fundamento de
que jamais pode ser paga uma dívida; só pode soar inclusive à má fé, que não
pode existir, quer no ambiente de negócio a que o devedor se sujeita por razões
profissionais, quer no tráfico normal do comércio, por ser a boa fé, aquilo que
pode ser considerada como a “seiva” de qualquer negócio, que move o
desenvolvimento das sociedades.
Os
bancos cuja actividade, ao abrigo do número 3 do artigo 3º da lei nº 14/21, de
19 de Maio (Lei do Regime das Instituições Financeiras), consiste na recepção
do público de depósitos ou outros fundos reembolsáveis, para utilização por
conta própria, designadamente, em operações de crédito; também são entendidos como sendo instrumentos
capacitantes e recapacitantes da economia, continuando a sê-lo na actualidade;
a não ser que se pretenda com estas isoladas atitudes colapsar o sistema
financeiro, com o crédito malparado, dada
a sua nocividade conhecida, para a economia e sistema financeiro.
Como
é perceptível, a fonte de
financiamento da economia, em que os agentes actuam, via banco, assenta nas
poupanças captadas por estas entidades financeiras, para potenciar as
actividades económicas empresariais e o consumo através do crédito, que
segundo o número 10 do artigo 3º da mesma lei é o acto pelo qual uma Instituição Financeira agindo a título
oneroso, coloca ou promete colocar fundos à disposição de uma pessoa singular
ou colectiva, contra a promessa de esta lhos restituir na data de vencimento,
ou contrai, no interesse da mesma, uma obrigação por assinatura, tal como uma
garantia;
Portanto, é dos recursos alheios, que os bancos
servem a economia nas suas mais variadas formas. Os bancos para além de serem instituições
captadoras de recursos, têm a missão de aplicá-los. E ao fazê-lo, financiam a
economia, não importa em que dimensão se fale. Esta é a sua vocação, com todos
os riscos associados.
Para
espelhar a insegurança normal desta actividade bancária, António Pedro de
Azevedo Ferreira in A
Relação Negocial Bancária, conceito e estrutura, Quid júris,
sociedade editora, 2005, p. 249), refere que a concessão de crédito assenta
entre outros, em dois vectores basilares: por um lado, no vector da confiança, onde se fundamenta a
aceitação de uma troca diferida; por outro lado, no vector do risco, derivado da possibilidade de não
cumprimento da promessa de pagamento.
Numa
sociedade em crescimento da actividade bancária e negócios, não será menos
repugnante, que se venha advogar sanidade, no não cumprimento de uma dívida, voluntariamente
contraída e aceite, nos termos em que foi e agora se pretende não pagar, sob
pretexto de a mesma não ter sido cobrada em devido tempo.
Dispõe o número 1
do artigo 301º do CC: “A prescrição
aproveita a todos os que dela possam tirar benefícios, sem excepção dos
incapazes.”
No
documento de fls. 43, extrai-se: “… Face
a responsabilidade que tenho no Banco X S.A, e em meio as condições que
disponho; compromete-me em efectuar o depósito mensal na minha conta o valor de
Akz. 20.000,00” (sic).
A acção executiva, donde resultam os Embargos
é tão só corolário das insucedidas tentativas de resolução por via negocial ou
graciosa. Diante de tudo, só mesmo as asas da imaginação
chegariam ao convencimento de que o facto de a acção não ter sido intentada
antes, a credora tinha caído no desinteresse.
O
Embargante deixou de cumprir as suas obrigações e quando o fez, fazia-o irregularmente,
como demostra o extracto da conta corrente de fls. 3 a 38. As dificuldades do empresário eram conhecidas
pelo credor. Tanto assim é que houve várias tentativas de negociação do
reescalonamento da dívida.
A
prescrição não pode amparar condutas de quem, pretendendo por todos os meios
furtar-se da obrigação; coloca-se numa situação de falência ou insolvência ou
estando efectivamente numa destas situações fortuitas; nada faz para o
cumprimento do crédito, ou pelo menos renegociá-lo, porque imbuído da esperança
de ver o manto da prescrição cobri-lo.
O
fim do direito não está e nem foi pensado para acomodar deliberadamente
atitudes nem comportamentos desviantes à vocação da justiça. O Direito assenta
sobretudo, nos já conhecidos e defendidos princípios romanos: cuique suum tribuere, neminem laedere, no
sentido de que, embora a oratória
possa, no livre arbítrio, levar muitas vezes ao indefensável; a verdade é que a
indulgência do credor, que não tendo perdoado a dívida, porque nunca houve
desinteresse; não pode ser entendida pelo devedor como livramento, na cobrança.
Defender
e validar a teoria de que o devedor relapso ante o incumprimento deliberado
deve beneficiar da prescrição nos moldes que é trazida nos autos, diante de
todos os factos verificados na execução do contrato de mútuo é tentar passar a ideia
do desvalor do crédito, como instrumento de financiamento e, os devedores, como
actores desobrigados, a coberto de tudo vale!
Mesmo que houvesse a alegada perda de
interesse pelo pagamento do crédito por parte do credor, ainda assim, tal perca
de interesse teria que ser apreciado objectivamente, como estipula o número 2
do artigo 808º do CC. E como se constata, esta não é certamente a situação,
dada a atitude assumida pelo credor para reivindicar o seu direito.
Os
agentes devem ter a honra, nos compromissos que assumem e, na qualidade de “motores”
da economia e do desenvolvimento das sociedades em que estão inseridos. A sua
acção deve ser guiada pelos mais nobres valores do tráfico comercial- a confiança e a boa fé. Não devem, com a sua conduta, criar descrença no mais
importante instrumento que constitui a alavanca para o emprego e bom desempenho
da economia e da sociedade. A este
propósito e quanto à confiança, solidez e estabilidade das Instituições Financeiras, dispõe o número 1 do
artigo 4º da Lei em referência:
“O sistema Financeiro é estruturado de modo a
promover a confiança, solidez e a sua estabilidade, favorecer a eficiente
captação de poupanças, bem como a promoção do desenvolvimento económico”
(itálico nosso).
No
cenário da economia, como é o de Angola, com as insuficiências normais decorrentes
da estrutura de formação dos seus agentes (empresariais, instituições ou
agentes financeiras) não é defensável, que por este factor, em superação, se
fragilize, ainda mais, a confiança na transação creditícia.
É
o cumprimento do dever de prestar que, satisfazendo o interesse do credor,
extingue em regra o direito à prestação. Por outro lado, a satisfação do
interesse do credor é o efeito normal do cumprimento do dever que recai sobre o
obrigado (João de Matos Antunes
Varela, in Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª Ed. Almedina, pg. 128).
A
prescrição só pode estar ao serviço de devedores, que estando de boa fé na
relação obrigacional, tenham com a sua conduta, mostrado interesse no dever de
honrar e cumprir a sua obrigação com os credores e que estes, no entanto,
mostrem desinteresse e falta de vitalidade na sua cobrança, como diz Antunes de Matos Varela, na mesma obra
e páginas citadas, quando se refere ao desaparecimento do interesse do credor,
como forma de livramento, do devedor, da obrigação de pagar.
Diante
dos factos aqui presentes, resulta: primeiro, a obrigação do devedor,
Embargante-recorrente cai fora das obrigações naturais e segundo, não se lhe
assiste razão, quando para eximir-se do dever de pagar a dívida contraída vem
levantar a escusa baseada na prescrição, comprovadamente inexistente.
b) Em relação à alegada prescrição dos juros
O
Recorrente veio invocar igualmente a inexigibilidade total de juros, por
contaminação decorrente da prescrição da dívida.
Se os juros, sendo frutos civís, podem ser: a)
remuneratórios, que consubstanciam o
valor que se paga pelo dinheiro emprestado, b) moratórios, para cobrir os prejuízos resultantes da mora no
desembolso do crédito (artigo 804º do CC) ou c) compensatórios, para a reparação efectiva dos danos. Os mesmos podem ter uma certa autonomia
em relação ao capital, nos termos do artigo 561º do CC.
Se
não há prescrição do capital do empréstimo concedido, pelo Banco ao Embargante;
só se desobrigará, se tanto, em relação ao pagamento de juros vencidos, nos 5
anos anteriores, conforme foi decidido na 1ª instância; considerando que a
decisão proferida se tem por transitada em julgado, em relação a esta parte,
por não ter sido validamente impugnado, pelo beneficiário. A mera referência
nas alegações de recurso, não tem o condão de se reapreciar o decidido, nesta
parte.
O objecto a apreciar em recurso incide sobre
matéria firmemente alegada e concluída como pretensão a reapreciar. Não tendo
sido feito; nada mais resta senão a conformação pelo decidido, em homenagem à
certeza e segurança jurídicas que as decisões judiciais carregam, quanto à
definição de direitos e os seus efeitos se tornem definitivos.
Os
processos estão sujeitos a custas, decorrentes da responsabilidade de quem dá
causa a acção ou dela tira proveito, nos termos combinados do nº 1 do artigo
446º do CPC, e do artigo 1º do Código das Custas Judiciais. No caso, e em sede
de recurso, tal responsabilidade deve ser suportada pelo Apelante.
Chegado
aqui, eis o momento de proferir;
V. DECISÃO
Nestes termos e fundamentos, os Juízes desta
Câmara, reunidos em conferência acordam em não dar provimento ao recurso e, em
consequência, confirmam a decisão recorrida, devendo a execução prosseguir seus
termos em relação:
1.
Ao
valor restante do capital cedido por crédito e;
2.
A juros,
não abrangidos pela prescrição.
Custas pelo Apelante.
Registe e
notifique.
Lubango,
24 de Abril
de 2025
Os Juízes Desembargadores
Relator: Domingos Astrigildo Nahanga
1.º Adjunto: Marilene Camate
2.º Adjunto: Lourenço José